Em meio a tanta polarização e ânimos exacerbados nas discussões políticas, sinto que precisamos falar sobre escrita e comunicação empática.
Nunca se debateu tanto política. Mas será que estamos mesmo dialogando? Como se expressar, sem alimentar ainda mais o sentimento de ódio que se instalou entre as pessoas?
Percebo que temos duas opções diante dos embates.
A primeira é acreditar que se trata de um jogo de “nós x eles” ou “bons x maus”. Nesse caso, muros vão sendo erguidos e quem “gritar mais alto” ou “fizer mais pontos” vence. E, no final, todo mundo saí perdendo porque relações estão sendo estremecidas só para provar quem tem ou não tem razão. E, com tamanho grau de divisão, é quase impossível não ter um “inimigo infiltrado” bem aí na família ou no seu grupo de amigos. (Se isso acontece com você, parabéns pela sorte!)
A segunda opção que nos resta é tentar entender o que nos conecta. E sei que tem horas que isso parece impossível. Mas é somente nos colocando no lugar do outro e compreendendo as suas necessidades e as suas escolhas, por mais diferentes (e até absurdas) que elas possam parecer, é que poderemos seguir conversando. Só assim poderemos transformar muros em pontes.
Não estou dizendo que seja fácil, nem que isso seja possível com todo mundo, mas eu acredito que você tenha pelo menos uma pessoa aí que valha a pena a tentativa. (Eu tenho uma aqui e já consegui alguns avanços.)
Acredito que a escrita pode ser uma grande aliada nesse momento. Ela nos permite uma reflexão mais calma, uma escolha cuidadosa das palavras e a possibilidade de menos interrupções no discurso.
Nesse sentido, acho louvável o fato de que nunca se escreveu tanto sobre política como nessas eleições. Só que olhando para grande parte dos textos que tem circulado por aí percebo que poucos deles cumprem o seu papel.
Um bom texto não é só aquele que expressa a nossa voz, os nossos anseios e as nossas indignações. Um bom texto é capaz de promover a conversa.
É muito fácil expressar a nossa opinião para as pessoas que já concordam com ela, afinal saímos de um mesmo ponto de partida.
É muito fácil também sair repostando conteúdos sobre política ridicularizando o outro lado da história.
Só que do que adianta ficarmos, cada um do seu lado, tentando reforçar o seu ponto de vista, sem que o outro, de fato, queira escutar o que temos a dizer?
O verdadeiro desafio é transformar o monólogo em um diálogo. Isso exige abertura, disposição e deixar o orgulho de lado.
Para isso, é preciso exercitar uma capacidade muito importante: a da empatia. E, não estou dizendo que seja fácil, nem que isso seja possível com todo mundo, mas eu acredito que, assim como eu, você tenha pelo menos uma pessoa aí que valha a pena a tentativa, estou certa?
Foi pensando nessas pessoas que eu reuni algumas dicas de comunicação empática que me ajudam nesses momentos e que também podem ser valiosas para você. Elas servem tanto para a escrita, quanto para a fala.
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Parte 1: como não erguer muros com as palavras
– Evite generalizações e não reforce a separação. Frases como “todo mundo que vota em Ciclano é XXXX.” ou “se tá a favor de Beltrano, só pode ser XXXXX.” só reforçam o clima de disputa e tem grandes chances de serem injustas. Não se trata de nós x eles. Quando for conversar com alguém, lembre-se que você está falando com uma pessoa que teve suas próprias experiências e construiu pontos de vista únicos.
– Não comece o assunto com acusações e controle-se para não cair na provocação. No contexto que estamos, é muito fácil apontar o dedo pro outro. Existem “telhados de vidro” dos dois lados. Ao julgar o outro apenas por sua escolha política, você corre o risco de desconsiderar aspectos importantes do que ela de fato representa na sua vida, ameaçando relacionamentos valiosos para você.
– Não use termos pejorativos e evite julgamento precipitados. Se o seu objetivo é dialogar com alguém, não chegue com pedras na mão. Isso só vai colocar essa pessoa se sentir atacada e a reação mais provável que ela terá será atacar de volta para se defender.
– Evite a ironia. Esse tipo de recurso só tem graça para quem está contando. Ele tende a inferiorizar quem está do outro lado e, mais uma vez, reforça a agressividade.
– Evite discussões em público ou nas redes sociais. Nestes ambientes, a preocupação com o olhar externo pode tornar a situação constrangedora e trazer a tona um nível ainda maior de orgulho, provocando uma sensação do tipo: “como essa pessoa ousa falar comigo assim na frente dos outros” ou “eu não vou o meu braço a torcer aqui, não quero parecer fraco em público.” Prefira conversas privadas onde os dois lados terão mais liberdade para se expor.
– Não levar para o lado pessoal. Nem tudo que o outro está dizendo sobre um partido X é uma ofensa pessoal a você. Saiba separar as coisas e tudo ficará mais brando.
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Parte 2: como criar pontes por meio das palavras
– Ouvir. Esse é o primeiro passo para estabelecer a empatia. Procure escutar o outro de forma atenta, sem julgamentos e sem interrupções. Busque perceber também o que não está sendo dito, mas está implícito na situação.
– Busque entender as necessidades do outro. Você pode fazer isso por meio de um pedido claro, do tipo: “Eu gostaria sinceramente de entender o que te faz pensar assim, você pode me falar sobre isso?”
– Exercite a sua empatia. Faço o exercício imaginário de se colocar no lugar do outro e sob a perspectiva dele, trace algumas hipóteses para entender como ele está se sentindo, por exemplo: “eu imagino que talvez o motivo para você pensar assim seja…Estou certa?” ou “Pode ser que você esteja se sentindo assim por causa de… É isso mesmo?”. Note que as hipóteses devem ser tratadas como o que elas realmente são: possibilidades, e não como certezas ou verdades absolutas.
– Mostre que você é capaz de entendê-lo(a) e busque por pontos em comum. Pode parecer difícil no começo, mas quase sempre é possível. Por exemplo: “assim como você, eu também estou me sentindo decepcionado neste momento” ou “eu percebo, que para nós dois, a segurança pública é uma questão muito importante” ou “nós crescemos juntos e eu sei que não foi nada fácil para você conquistar o que tem hoje. Por isso, eu entendo que você esteja se sentindo ameaçado…”
– Se mostre. Fale de forma sincera e respeitosa sobre como você está se sentindo diante dessa situação.
– Não seja o dono da verdade. Tudo bem mostrar que você também tem dúvidas e inseguranças: “às vezes, eu tenho medo do futuro, mas nesse momento acho que essa é a minha melhor opção…”.
– Torne a conversa pessoal. Evite o discurso pronto e padronizado. Se você quer realmente tocar uma pessoa, não adianta apenas ficar compartilhando conteúdos prontos. Ela precisa sentir que você está se esforçando e que se importa com ela. Pense no que realmente importa para essa pessoa. Se possível, busque exemplos da vida real: “eu me lembro daquela vez que você me disse isso…” ou “você se lembra de ciclano, nosso amigo? Ele está preocupado por causa de…”
– Abra espaço para as respostas. Por exemplo: “eu gostaria de saber como você se sente diante disso” ou “o que você acha dessa possibilidade?”
– Reconheça e expresse aquilo que você vê de bom no outro. Lembre-se que o relacionamento de vocês vai muito além da política: “apesar de não concordar com a sua escolha, eu sei que isso não iguala você ao político X” ou “por mais que a gente pense de forma diferente agora, eu sei que você é uma pessoa generosa e sou grata por aquela vez…”
– Respire fundo. Diante de uma grande raiva, pense bem se vale a pena colocar uma amizade em risco por causa de uma situação passageira de política. Conte até dez e lembre-se que tem horas que a palavra vale prata, mas o silêncio vale ouro.
-Você pode chegar a conclusão de que certas coisas são realmente inaceitáveis no seu ponto de vista. Você pode dizer isso com clareza e firmeza, sem ser cruel com o outro.
– Mantenha o respeito e saiba a hora de parar. Você já expôs todos os seus argumentos? Já ouviu o que a pessoa tinha a dizer? Então, respeite a opinião do outro, por mais que você não concorde com ela, e parta para outro assunto. A vida continua!
Esses foram alguns caminhos que consegui perceber para uma comunicação mais empática e menos agressiva. Isso não quer dizer que sejam os únicos, nem que você tenha que ficar travado com todas essas dicas ao escrever ou conversar. Colocá-las em prática é um desafio que eu também enfrento e nem sempre consigo. São muitos anos de condicionamento e, diante da provocação do outro e de coisas que me parecem injustas, é difícil não deixar o sangue subir a cabeça.
O mais importante é não se esquecer que você está falando não com um inimigo, mas com uma pessoa, que como você deseja ser respeitada e não atacada pelas escolhas que faz.
E te digo mais uma coisa: exercer a comunicação empática o tempo todo exige grandes doses de energia. Por isso, escolha quais as “batalhas valem a pena lutar”, ou melhor, quais as conversas que valem a pena investir, afinal não estamos em uma guerra, não é mesmo?
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